terça-feira, 14 de março de 2017

Carta Protocolada na Secretaria Municipal de Cultura

São Paulo, 10 de fevereiro de 2017.
A/C Sr. André Sturm (Secretário Municipal de Cultura de São Paulo)
Assunto: Comissão de Seleção do Edital de Fomento à Dança da Cidade de São Paulo

O Fórum de Artes Negras e Periféricas vem por meio desta chamar atenção para a importância da inclusão da perspectiva cultural marcada pela diversidade no PROGRAMA DE FOMENTO À DANÇA da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo. Uma ferramenta pública fundamental que, segundo o Artigo 1º da Lei deste edital, surge com a finalidade de “apoiar a manutenção e o desenvolvimento de projetos de trabalho continuado em dança contemporânea; fortalecer e difundir a produção artística da dança independente; garantir melhor o acesso da população à dança contemporânea; e fortalecer ações que tenham o compromisso de promover a diversidade dos bens culturais”.

Diante desses critérios, gostaríamos de abrir uma reflexão importante sobre a interpretação de conceitos que indiretamente propiciam o cerceamento da participação de grupos, companhias e coletivos que possuem o enfoque na cultura brasileira, a partir das matrizes africanas e periféricas, que de maneira equivocada, geralmente não são vistos neste contexto como grupos CONTEMPORÂNEOS, sob o olhar crítico da grande maioria que compõe a banca de curadores nas edições do programa em questão.

Por tanto, desde a primeira edição, nota-se que a apreciação dos projetos é realizada por uma equipe que, em sua maioria, desconhece os referenciais estéticos e poéticos sobre as Culturas Negras e Periféricas, comprometendo a sua capacidade avaliativa sobre essas formas de dança, já que seu exame é realizado a partir de quadros de referência eurocentrados e/ou euro-estadunidense. Tais recursos de avaliação referem-se, principalmente ao pensamento hegemônico reproduzido nas maiorias das universidades, escolas e academias de dança convencionais, que geralmente não incluem, reconhecem e compreendem a dança contemporânea diante de um corpo de identidade negra com vocabulários de movimentações afro-brasileiras, bem como da “Cultura de Rua” denominada hip-hop.

Na tentativa de deslegitimar essas diversas formas de expressão, o caráter de contemporâneo mantém-se vinculado ao antigo mecanismo de exclusão que remete, em última instância, ao período colonial. Ignora então, o caráter histórico das tradições culturais oriundas de diversas etnias que migraram da África para o Brasil, bem como a presença cultural das comunidades indígenas, desconsiderando o fato de que elas conviveram e convivem com a mesma força criativa que a cultura de matriz europeia, tão valorizada dentro das instituições de ensino formal.

Conforme o edital, no item 1.2.: “Entende-se por dança contemporânea um modo de produção artística que envolve investigação, pesquisa e criação, não diretamente relacionadas a critérios biográficos de artistas ou categorização da obra por estilo, conteúdo ou técnicas”. Aí nos deparamos com outra armadilha institucional para justificar a exclusão destes grupos de Dança Negra Contemporânea, bem como as danças periféricas, que são deslegitimados pela banca de maioria acadêmicos, que geralmente definem nossos trabalhos como “grupos folclóricos e/ou tradicionais, reprodutores de coreografias que não possuem investigações, pesquisas e criações no processo de montagem de um espetáculo”.

Sendo assim, o Fórum de Artes Negras e Periféricas reivindica a DEMOCRATIZAÇÃO E POPULARIZAÇÃO do acesso ao Programa de Fomento a Dança, através de uma comissão de seleção com um olhar mais abrangente, bem como, indicada por instituições, organizações e fóruns representativos que discutem as artes negras, periféricas e populares na cidade de São Paulo. No entanto, devido aos nomes indicados na última edição percebemos a necessidade de rever os mecanismos de composição da comissão ampliando o convite de maneira pública para que outros movimentos e entidades possam apresentar nomes para compor o quadro de curadores.

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